terça-feira, 20 de outubro de 2015

Star Wars - Episódio VII: O despertar da discriminação

   Eu estava trabalhando em outro texto, quando me deparei com um assunto que julgava já ser coisa do passado, do longínquo fim de 2014: o racismo [1] em relação ao novo Star Wars. Como não poderia deixar de falar sobre o assunto, que leva a outro, a discriminação de mulheres, aqui estamos.




Apesar de que essa imagem, a partir da acusação de discriminação contra brancos, associe o movimento negro ao marxismo cultural, é bom informar que, embora o marxismo cultural realmente exista e tenha os próximos que seus críticos dizem que tem, ele não é "marxista" em si. Este link explica isso.

   Quando o primeiro teaser [2] de "Star Wars - Episode VII: The Force Awakens" foi lançado, ano passado, a presença de um stormtrooper [3] negro despertou a ira de muito "fã", as aspas aqui se devendo por motivo simples: tais pessoas não podem ser realmente consideradas fãs. Por que não? Porque um fã (do inglês fan, encurtamento de fanatic, "fanático" com influência do termo fancy, coletivo para "seguidores de algum hobby ou esporte") que se preze procura saber todo o possível a respeito daquilo que lhe desperta o fanatismo, de modo que, se determinada produção originalmente pertence à mídia quadrinhística, por exemplo, mas foi estendida para livros, jogos eletrônicos e outras mídias, o fã a seguirá, pode até não gostar, mas irá atrás para experimentar. Isso diferencia o fã do consumidor casual, ser fã requer necessariamente um aprofundamento no universo da obra.



Sana Solo, ex-esposa de Han Solo
também é alvo dos falsos fãs de SW por ser negra.

   E Star Wars é uma obra cujo universo não se restringe aos filmes e prequências [4], havendo histórias e mais histórias em quadrinhos, livros, os jogos eletrônicos de console, de computador e mais uma porrada de outras coisas que coletivamente são tratadas como o "Universo Expandido" (Expanded Universe). E o que o Universo Expandido tem a ver com isso?
   Tudo! Embora a origem dos stormtrooper remonte à clonagem em massa de Jango Fett, o varão de tez clara pertencente ao povo mandaloriano e que atuava como caçador de recompensas, sendo considerado o melhor exemplar de guerreiro humano de toda a Galáxia, o Universo Expandido nos explica que a clonagem em massa não mais foi tão utilizada a partir de algum momento após a instauração do Império Galático por Palpatine, o Darth Sidious, começando a ser feito o recrutamento de homens naturais [5] para a Stormtrooper corps.



A Capitã Phasma.

   E homens naturais não correspondem apenas a varões de tez clara, mas também a mulheres de tez clara e varões e mulheres de tez escura, nas mais diversas tonalidades. Assim, muito embora o Universo Expandido esteja sendo consideravelmente desconsiderado pela Disney, quase tudo sendo tratado como "não oficial", existe sim uma senhora margem para a existência não apenas de stormtroopers negros, como também de stormtroopers mulheres - tal como a Capitã Phasma (Gwendoline Christe).



Cartaz oficial de "Star Wars - Episode VII: The Force Awakens".

   Para explicar melhor e mais detalhadamente, o Império Galático durou cerca de 23 anos, sendo instalado em 19 BBY [6] e derrubado em 4 ABY [7], com a morte de Darth Sidious e de Darth Vader. Durante esse tempo, os stormtrooper passaram de soldados oriundos exclusivamente dos centros de clonagem espalhados pela Galáxia - e que foram perdidos - para soldados recrutados entre a população humana dos mais variados planetas sob o controle do Império, incluindo os filhos e filhas de stormtrooper.
   Havia barreiras contra as mulheres durante o Império? Havia, mas elas passam a existir entre os stormtrooper, embora em menor quantidade, ao mesmo tempo em que não-clones passam a ser recrutados, chegando, inclusive, a ocupar altos postos ou integrar a Guarda de Coruscant. Assim, a "stormtrooper cromada", Capitã Phasma, também não pode ser vista como algo anômalo, principalmente porque ela faz parte de um grupo remanescente do Império, e, no Universo Expandido, os estados imperiais remanescentes fizeram amplo recrutamento de mulheres (e de espécies não-humanas) - lembrando ainda que, também no Universo Expandido, há as mulheres mandalorianas, guerreiras tão ou mais exímias, valorosas e honradas quanto os varões mandalorianos.



Mulheres como stormtrooper.

   Assim, esses retardados simplesmente não podem ser considerados fãs, sendo que, muito provavelmente, o Imperador Palpatine em pessoa os eletrocutasse por tamanha sandice. Sim, talvez ele fizesse, visto que o Império Galático era especista e, em certa medida, discriminatório para com as mulheres, preferindo homens varões e excluindo outras espécies e mulheres, mas não racista - muito embora haja uma ausência significativa de atores negros nos seis primeiros filmes, a não ser que estivessem todos cobertos por armaduras ou fazendo vozes, a exemplo de James Earl Jones, que fez a voz de Darth Vader. E esse especismo tão próprio de Palpatine/Darth Sidious, não é percebido em nenhuma outra personagem, a não ser, talvez, no julgamento inicial de Han Solo para com os ewok, tratando-os como primitivos.





   Lembrando que a princesa Leia Organa (Skywalker) e sua mãe, Padme, eram protagonistas e que, apesar de secundários nos filmes anteriores da franquia, os personagens negros que estiveram presentes foram, são e continuarão sendo marcantes, além de terem importância dentro do universo da franquia. Não sabem de quem estou falando?



Apresento-vos Lando Calrissian, o primeiro de seu nome, senhor da... Não, 'pera, franquia errada.
Lando (Billy Dee Williams) tinha uma mina de gás no planeta Bespin, residindo na Cidade das Nuvens.

   E, claro:



Mace Windu, Mestre Jedi e membro do Conselho Jedi, teria criado o estilo de combate vaapad.

   Apenas para encerrar do jeito que o Capitão América gosta, vocês sabiam que o segundo romance da trilogia escrita por Timothy Zahn, no Universo Expandido de Star Wars, a "Trilogia Thrawn", teve por título "Dark Force rising", isto é, "A Ascensão da Força Negra", mas chegou a ser traduzido no Brasil como "O Despertar da Força Negra"?



Uma capa de "Dark Force rising".





NOTAS

[1] Diferentemente do que determinados grupos querem fazer parecer, com a seu novilinguísmo e a utilização da expressão "racismo inverso", o termo "racismo" não é nem nunca foi sinônimo de "discriminação que pessoas de pele clara e ascendência europeia fazem com pessoas de pele escura e ascendência africana", racismo é pura e simplesmente "discriminação motivada pela raça", de modo que sim, da mesma forma que alguém de "raça branca" pode discriminar alguém de "raça negra", pode fazer em relação a alguém de "raça amarela" ou "raça vermelha", mas alguém de "raça negra", "amarela" ou "vermelha" pode discriminar alguém de qualquer uma das outras "raças" sim! Determinados discursos contra "brancos", muito comuns nas redes sociais, são discursos de ódio (não existe essa estória de que "contra o opressor pode", discurso de ódio continua sendo discurso de ódio, independentemente de quem faça e quem atinja) e trazem certo quê de discriminação sim!

[2] Apenas para constar: teaser e teaser trailer são a mesma coisa. Vide o texto do Vírgula.

[3] Literalmente, stormtrooper seria algo como "soldado da tempestade" ou "soldado tempestade" e mesmo "soldado tempestuoso", sendo isso uma das diversas referências de Star Wars à Segunda Guerra Mundial, no caso e, entre outras coisas, à estratégia blitskrieg (guerra relâmpago), efetuada pelos soldados do III Reich.

[4] Preferi assim traduzir o termo prequel, em oposição à "sequência", do que o utilizar ou fazer uso do aportuguesamento (que vez ou outra vejo por aí) "prequela".

[5] Tecnicamente, clones são seres artificialmente gerados, ainda mais se for considerado o processo de clonagem empregado, sem nenhuma espécie de barriga de aluguel, mas apenas máquinas e tanques. Além disso, o crescimento acelerado (pulando a infância direto para a fase adulta) e o implante de memórias falsas referentes aos períodos pulados apenas contribuem para fazer de tais clones muito mais "coisas" do que "pessoas", sem contar, claro, no fato de terem sido concebidos única e exclusivamente para atender a determinada finalidade, como instrumentos.

[6] Sigla para Before Battle of Yavin, isto é, "Antes da Batalha de Yavin", sim, aquela vista em "Star Wars - Episode IV: A New Hope". Também pode ser grafado ABY, "Antes da Batalha de Yavin".

[7] Sigla para After Battle of Yavin, isto é, "Depois da Batalha de Yavin". Também pode ser grafado DBY, "Depois da Batalha de Yavin".






REFERÊNCIAS

CAPPS, Kriston. Of course there are black stormtroopers in Star Wars. Publicado em: 28 Nov 2014. Disponível em: <http://www.theatlantic.com/entertainment/archive/2014/11/of-course-there-are-black-stormtroopers-in-star-wars/383259/>. Acesso em: 20 Out 2015.

HARPER, Douglas. Fan (n.2). In:___. Online Etymology Dictionary. 2001-2015. Disponível em: <http://www.etymonline.com/index.php?term=fan&allowed_in_frame=0>. Acesso em: 20 Out 2015.

SALGADO, Lucas. Star Wars - O Despertar da Força sobre ameaça de boicote por ter mulher e negro como protagonistas. Publicado em: 20 Out 2015. Disponível em: <http://www.adorocinema.com/noticias/filmes/noticia-116719/>. Acesso em: 20 Out 2015.

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