Sete

   No ápice da tarde, o cálido vento fustigava o capinzal, ao qual estava entregue aquela vasta planície onde havia uma construção inacabada, um cubículo com os vermelhos tijolos e a branca argamassa aparentes, circundada por paus envelhecidos e arame farpado enferrujado.
   Fora do círculo hostil, próximo a um pálido “T” composto por um fino pau, uma tábua a ele pregada e um redondo cupinzeiro, o nu e enlameado jovem levantou-se já velho e sentindo como se atrás houvesse alguém, por várias vezes olhando por cima do ombro e virando-se apenas para constatar a ausência de tal ser.
   Vagarosamente, sempre a verificar a retaguarda, ele dirigiu-se por entre o capinzal até a construção inacabada, especulando a possibilidade de haver alguém ali que pudesse ajudá-lo a descobrir onde e quando estava, mas deparando-se, quando já estava próximo, com a cerca de arame farpado, não encontrando sequer um espaço entre os arames que fosse suficientemente amplo para permitir sua passagem, ao que decidiu ladear a estrutura até encontrar uma passagem.
   Assim, andou um pouco, até encontrar um espaço na cerca, espaço esse que parecia ser o lugar onde deveria haver uma porta. O velho passou por ele e pôde ver que o terreno circular dentro dela tinha o mato muito bem aparado e que a construção não tinha portas nem janelas, somente os espaços para colocá-las e as paredes, não tendo também telhado, mas possuindo teto. Depois de certo tempo, fortes latidos passaram a ser ouvidos. Eles vinham do interior daquele prédio.
   Uma vez lá dentro, ele viu que as paredes, o chão e o teto eram amarelos e que, dependurado na parede imediatamente oposta à da porta, havia um quase invisível, devido à cor, capacete de operário cheio de terra preta, da qual se erguia um grande e amarelado pé de milho, cujas raízes, tendo atravessado o objeto, tocavam o piso e pareciam querer adentrar por ele.
   Não muito distante do capacete, uma baixa e alba criatura com face e corpo simiesco, juba e orelhas leoninas, braços e mãos humanas, leporinas patas traseiras e pintas pretas em forma de “s” andava dum lado para o outro com os seus olhos verdes fixados no velho – a longa e preênsil cauda ereta a segurar um grosso cilindro, no qual se empoleirava uma grande ave preta d’olhos vermelhos.
   Então, o velho tentou aproximar-se, mas o ser latiu estrondosamente até o intruso agachar-se com as mãos nos ouvidos, encarando-o face a face, nariz a nariz. Foi quando, estranhamente, o homem lembrou-se, sem desviar o olhar dos olhos da criatura, de todas as ilegalidades por ele cometidas, logo em seguida a ave preta levantando a cabeça e abrindo as enormes asas, que pareciam tocar as paredes, para revelar que, por debaixo delas, era estrelada como um límpido céu noturno.
   Tendo visto aquilo, o velho ficou momentaneamente paralisado, compreendendo que não merecia estar ali e prontificando-se a sair, sendo que, uma vez atravessado a porta, todo o cenário pareceu distanciar-se em fuga até ficar completamente cinza e o chão repentinamente desaparecer.
   Em queda livre rumo ao desconhecido fundo daquela cinzura que foi gradativamente tornando-se densa escuridão, o jovem resignou-se e fechou os olhos, acordando sobressaltado em sua cama, tal como se houvesse caído nela e, ante o susto, acabou por rolar para fora dela.

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